'Grande imprensa' sai em defesa de jornalista de Facebook na Justiça dos EUA (2024)

Uma ação judicial civil, movida pela jornalista amadora Priscilla Villareal contra a polícia e a cidade de Laredo, no Texas (na fronteira com o México), aterrissou na Suprema Corte dos Estados Unidos. A ação confronta os direitos constitucionais à liberdade de expressão e de imprensa com a doutrina da “imunidade qualificada” das autoridades públicas, incluindo as policiais.

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Apesar de a texana ser apenas uma “jornalista cidadã” (citizen journalist), como se define nos EUA as pessoas que não são jornalistas profissionais, mas usam a mídia social ou sites na internet para divulgar notícias, ela vem recebendo o apoio de grandes órgãos tradicionais de imprensa: 21 organizações noticiosas, entre as quais The New York Times, Washington Post, The Atlantic, NBC News, ProPublica e Slate, protocolaram pedidos para serem amici curiae (amigos da corte) a favor da jornalista amadora.

Fizeram a mesma coisa diversas organizações conservadoras, liberais e libertárias, tais como o Sinclair Broadcast Group, o CATO Institute, o Manhattan Institute e a Americans for Prosperity Foundation, financiada pelo bilionário Charles Koch, entre outras.

Priscilla Villareal, que é mais conhecida regionalmente pelo apelido que adotou — “La Gordiloca” (sendo “gordi” uma abreviação de gordita) — encontrou no jornalismo cidadão as doses diárias de adrenalina que precisava para vencer uma depressão (causada pela morte de um filho nascido prematuro).

Para isso, passou a usar sua página no Facebook para transmissões ao vivo e publicação de notícias locais por vídeo e textos em inglês, espanhol e em Espanglish (uma mistura de espanhol com inglês). De preferência, ela cobre crimes, casos de corrupção e acidentes — tudo misturado com fofocas e fotos e posts pessoais, de acordo com o Los Angeles Times.

A publicação se tornou um sucesso, com mais de 200 mil seguidores em Laredo, cidade com 260 mil habitantes. “Ela também se tornou um sucesso”, disse ao Columbia Journalism Review o professor de jornalismo da Texas Christian University, em Fort Worth, Daxton Stewart. As empresas a estão contratando para anunciar seus produtos. Fãs lhe pedem autógrafo e selfies.

Mas ela também arruma encrencas. Em 2017, a polícia de Laredo emitiu um mandado de prisão contra ela basicamente porque ela “furou” o Departamento de Polícia da cidade — isto é, ela divulgou informações antes de o Departamento de Polícia fazer seu solene anúncio oficial de um caso.

A polícia a prendeu, e um promotor a denunciou por violação da lei “Texas Public Information Act”, que proíbe a “divulgação de informações ainda não disponibilizadas ao público”. Ela foi acusada de violar a lei estadual que criminaliza a “solicitação de informações oficiais sigilosas, com a intenção de obter um benefício”.

O Texas define “benefício” como “qualquer coisa razoavelmente considerada uma vantagem ou ganho econômico”. No caso, La Gordiloca teria obtido tal benefício por publicar, entre outras coisas, o nome de um patrulheiro de fronteira que cometeu suicídio, “com a finalidade de promover sua página no Facebook”, segundo a polícia.

Essa lei estadual do Texas foi criada para inibir corrupção e divulgação a alguma empresa de informações internas em contratos governamentais — não para punir jornalistas, de acordo com a revista libertária Reason. Um juiz estadual matou a ação contra La Gordiloca na chegada. Entre outras coisas, o juiz argumentou que a lei era inconstitucionalmente vaga.

Ação civil

Assim sendo, a jornalista amadora moveu uma ação civil, desta vez na Justiça federal, contra os policiais envolvidos em sua prisão e a cidade de Laredo. Ela alegou que os réus violaram seus direitos à liberdade de expressão e de imprensa, garantidos pela Primeira Emenda da Constituição, bem como os direitos previstos na Quarta Emenda.

Um juiz federal no Texas rejeitou o pedido da jornalista amadora, com o argumento de que as autoridades policiais são protegidas pela “imunidade qualificada” — uma doutrina jurídica que protege policiais e outras autoridades governamentais contra ações civis indenizatórias, a não ser que os autores da ação provem que eles violaram direitos constitucionais ou legais “claramente estabelecidos”.

É quase impossível ter sucesso em uma ação desse tipo, diz o site Capital B: “Para desqualificar uma autoridade policial da imunidade qualificada em uma ação civil, é preciso haver uma decisão anterior em que as ações da autoridade policial — na mesma jurisdição e em circunstâncias idênticas — foram declaradas inconstitucionais ou ilegais”.

Priscilla Villareal recorreu a um tribunal federal de recursos. Um colegiado de três juízes do Tribunal Federal de Recursos da 5ª Região, o mais conservador do país, decidiu em favor dela. Mas o estado recorreu ao tribunal pleno, que modificou a decisão por 9 votos a 6, com o argumento de que “não houve inconstitucionalidade óbvia no que aconteceu a ela”.

No voto dissidente, o juiz conservador James Ho, nomeado pelo ex-presidente Trump, escreveu: “Priscilla Villarreal foi colocada na cadeia por fazer uma pergunta a uma autoridade policial. Se isso não é uma violação óbvia da Constituição, é difícil imaginar o que pode ser”.

É possível que a Suprema Corte conceda certiorari (isto, é, aceite julgar) o caso. Mas isso só irá acontecer no próximo ano judicial, que vai de outubro de 2024 a junho de 2025.

Com informações dE Columbia Journalism Review, The New York Times, Los Angeles Times, ABA Journal, Legal Information Institute, Capital B e The Laredo Morning Times.

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